sábado, 3 de julho de 2010

POR QUE ENSINAR FÍSICA?


(...)Antes de mais nada, deve ser claro para todo professor que ensinar também é um processo de aprendizado. E não só da matéria que se está ensinando; ao ensinar, estabelecemos uma relação com aqueles que estão nos ouvindo.

(...)O educador, ao educar os outros, está constantemente se educando.Desde uma simples demonstração do movimento pendular para alunos do nível básico ao cálculo da função de correlação de um campo quântico,o ensino da física deve sempre expressar sua característica mais fundamental: física é um processo de descoberta do mundo natural e de suas propriedades, uma apropriação desse mundo através de uma linguagem que nós, humanos, podemos compreender.

Talvez a parte mais difícil no ensino da física seja a tradução do fenômeno observado em símbolo. Uma coisa é ver o pêndulo oscilar, outra é escrever uma equação que represente a variação da sua posição no tempo. Mas é justamente aqui que o desafio pode ser transformado em bônus; um dos aspectos mais belos da ciência é ela ser capaz de explicar quantitativamente fenômenos observados.

Então, o ensino da física deve, necessariamente, conectar a visualização do fenômeno e sua expressão matemática. Lamentavelmente, ainda é possível para um aluno terminar a oitava série sem jamais VER algum fenômeno ligado às equações que ele ou ela estudou em classe. Eu mesmo sou vítima dessa prática de distanciamento entre a física da sala de aula e a física do mundo; só vi minha primeira demonstração na universidade!

Não existe nada mais fascinante no aprendizado da ciência do que vêla em ação. E, contrariamente ao que se possa pensar, não são necessárias grandes verbas para montar
uma série de demonstrações efetivas e estimulantes, tanto para o professor como para
seus alunos. Se os alunos (ou o professor) não têm carro, use uma bicicleta para discutir
conceitos básicos da física newtoniana. Se nem uma bicicleta está disponível, use um carrinho de rolimã; certamente, algo se move na vizinhança de sua escola.

Mais importante ainda é levar os alunos para fora da sala de aula, fazêlos observar o mundo através dos olhos de um cientista aprendiz. Estabeleça analogias entre o movimento
de um pêndulo (que você traz no bolso, feito de pedra e barbante) e as oscilações dos balanços no parque ou nosgalhos das árvores. Explique a idéia de modelar o mundo, que é tão fundamental para a ciência, enquanto seus alunos brincam com o pêndulo feito de pedra e barbante e as árvores oscilam ao vento; oscilações forçadas, ação e reação, ressonância… Às vezes, nós educadores esquecemos de nos empolgar com a beleza daquilo que estamos ensinando. Nesse caso, como podemos esperar que nossos estudantes se empolguem por si próprios?

Como nos átomos, é necessário um fóton para estimular uma transição para um nível superior. E a freqüência do fóton não é arbitrária, mas deve ser ajustada com grande precisão para que o estímulo seja bem sucedido. A mensagem do educador também. (...)

Marcelo Gleiser
Professor de Física do Dartmouth
College em New Hampshire, USA, e
autor dos livros A Dança do Universo e
Retalhos Cósmicos (Cia. das Letras). É
ainda colunista de divulgação
científica da Folha de São Paulo e
colabora no Globo Ciência.

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